domingo, 19 de fevereiro de 2023

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"Foi a terceira vez que iria propor a minha inscrição na Ordem dos Jornalistas, Redactores e Tipógrafos. 
Novamente e munido de um longo texto original, o terceiro por sinal, fazia-me acompanhar do certificado de habilitações que me conferia a designação de Doutor em Ciências da Comunicação, vulgo Jornalista.
Numa pasta comprada para a solenidade que se impunha e preenchidos todos os impressos, vinha por aquele meio solicitar ao Digníssimo Bastonário da dita instituição a admissão da identificada pessoa a Jornalista especialista em Factos do Passado.
Na volta do correio chegava agora a devolução do processo com o carimbo vermelho Reprovado Sem Direito a Recurso. 
Abaixo da cruel mancha esborratada, vinha uma parca mensagem do censor a justificar o motivo do chumbo. Sem complacência e com todo o peso de uma marreta, as bordas da mancha assim impressa denotavam os salpicos sangrentos daquela decisão.
O proponente foi anteriormente informado que a esta Ordem só é admissível a inscrição de jornalistas doutos em Ciências da Comunicação que noticiem factos do presente. E assinado de forma gatafunhada.
Como pode um jornalista anunciar factos do presente, ou até mesmo, especulações sobre o futuro?
Com que direito me impedem que divulgar o passado? Aquilo que acontecido não foi presenciado por outros.
Assim foi, posto isto, ingressei no Colégio Honorífico dos Historiadores e Contadores de Factos do Passado. Agora sim, na plenitude do meu vislumbre sobre o acontecido, posso deixar testemunho dos sentimentos e emoções resultantes daqueles momentos que importa guardar.
E como eu sou especialista em cepticismos e nuvens negras a pairar sobre o futuro da humanidade ..."
(11.2.2020)

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