(...) "Todos os textos deviam, impreterivelmente, começar, melhor escrevendo, de continuar após o conjunto de sinais, abre ponto ponto ponto fecha. Tudo é uma continuação de algo começado através de um sistema com ramificações múltiplas que nos confundem e conduzem a atenção para aquele momento - o início do texto.
E depois?
Depois chega a matemática com um balde e uma esponja.
A matemática, suprema arte da concordância através da simbologia, deposita de forma ordenada o esquema da ordem ou do caos. O resultado. O resultado correcto ou incorrecto, admissível ou questionável.
Perante o resultado, chegado ao momento, à acção que inicia a própria acção, aceite a matemática, assumimos o a importância da figura do balde e da esponja. Servem para apagar, lavar, dar corpo a um vazio que se preenche. Muitas vezes usamos a mesma água de lavagens anteriores para expurgar aquilo que nos parece desnecessário. A utilização de águas que não são puras, condiciona-nos e começamos sempre, assim, da mesma forma. Acções que deveriam ser novas e únicas, assumem os mesmos resquícios de impurezas que condicionam o início e menos a continuidade.
O balde e a esponja, que expurga os condicionalismos do pensamento e da futura acção, afiguram-se como o elemento que visualmente é desprezível ou desconsiderado, mas que por sua utilização como ferramenta crucial, permitirá a assumpção da revolução, enquanto começo que não carrega a inspiração de um passado.
A questão fundamental, se se conseguir sobrevoar a paisagem acima da linha de observação do horizonte e retirarmo-nos fisicamente do nosso centro de decisão, é ter a capacidade de gerar como que uma onda de entendimento que consegue sair da nossa perspectiva horizontal de curto alcance, nunca para além da nossa visão e observar sob condição de julgamento vertical, e desta forma produzir rupturas. Se o farol ilumina os mares fechados nas noites de tempestades até ao limite da força do seu rotativo foco de luz, também é certo que quem está em mar revolto na busca de pontos de orientação, estará condicionado por diversos elementos à capacidade de no meio do breu conseguir discernir a luz de aviso que o poderá salvar. A condição de um pode não chegar à necessidade do seu outro. Se o farol não orientar a luz em constante rotação numa intermitência cadenciada e se fixar por deficiência num qualquer ponto, do mar poderá por desorientação, ser confundida com alguma estrela ou tapado por um nevoeiro mais cerrado. Do mar, a busca desesperada por um sinal, pode ao mesmo tempo condicionar a sua procura.
A ruptura é a colisão e o consequente corte com a ramificação das linhagens e estirpes de raciocínio e acção da história. A pureza que se pretende alcançar é o momento que esvazia o hábito. Que apaga a história, atirando-a para a memória como uma imagem estática, e por outro lado, assuma a introdução do mecanismo da esponja. Sintética ou natural, a esponja expande-se por absorção, no limite da sua capacidade, à retenção de elementos exteriores.
O expurgar dos condicionalismos anteriores e a sua renovação por novos conceitos, têm a capacidade de gerar o momento zero. Zero de inexistente e vazio. Estruturalmente o vazio será sempre observado na condição de ausência de conteúdo mas, obrigatoriamente, não ignorando a forma ou o corpo que permitirá ser o receptáculo de uma nova ordem de início. Existe a forma que o sustém, edifício vazio, diferente do vazio disperso e não passível de ser agregado numa unidade. O zero como figura mítica da inexistência de tudo e do todo, não é aqui considerado como ideia prática. O infinito ou sem fim do espaço, e o zero sem ausência de matéria ou pensamento, são conceitos gerais da humanidade que não expurgou a sua finitude e limitação do conhecimento e observação, pela incapacidade de conhecer (dar respostas) três dos vários elementos básicos da existência humana.
Sendo, o início absoluto, Big Bang, caso contra natura, a matéria explodiu por contracção e implosão; a vastidão do espaço, que permite observar o perto sem alcançar o longínquo, cada vez mais longe por introdução de novas matemáticas e tecnologias que nos apresentam como resultado que somos, um azar da evolução e das catástrofes que geraram as condições físicas e químicas para a nossa existência. Ao ser humano que se assumiu como predestinado pelo omnipresente, omnisciente e omnipotente, espécie inteligente que evoluiu no paradoxo que demonstra a sua condição ínfima da estatística, gerou um momento inicial para consumo da sua condição. Hoje a ciência mostra que o Homem enquanto ser vivo em partilha, com os demais elementos animais e vegetais existentes no seu espaço instransponível, é a única forma de vida, sob condição predadora que poderá decidir a extinção não só de grupo mas da unidade do planeta. Se os diversos anteriores eventos catastróficos que conduziram à interrupção dos processos de evolução dos seres em evolução no planeta Terra, tiveram origem em fontes exteriores, por colisão de meteoritos e colisão com outros objectos que geraram outras rotas de desenvolvimento da Terra, despertando-a no caos e na destruição para a criação de novas formas de vida, agora, a humanidade pode caminhar na direcção do abismo catastrófico da destruição e desintegração do planeta. Este é o factor que faltava na composição dos três elementos básicos da interpretação que o ser humano assume - a detecção do vazio.
Todos os textos deveriam começar com (...), abre ponto ponto ponto fecha. Tudo é uma continuação de uma manifestação. A capacidade que expurgar o passado, poderá ser a maior revolução que qualquer pessoa possa em algum momento da sua vida almejar. No fundo somos micro rupturas e espirros de revoluções, caminhos percorridos em circulo como a rotação do farol, sempre apontando na mesma elipse para disfarçar que a luz que o faroleiro apronta para as noites negras possa produzir algum aviso para lá do mar.
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